Parcelso - A Medicina e o Metafísico

Um precursor da Homeopatia ?

Em uma aproximação simplista poderíamos afirmar que a Alquimia seria uma espécie de Química Transcendental e haveria entre as duas a mesma relação que existe, por exemplo, entre a Astrologia e a Astronomia, e a mesma diferença: uma é de caráter nitidamente espiritualista e a outra, materialista, ou, utilizando uma linguagem mais atual, uma é fenomênica – a química – pois abarca os fenômenos enquanto tais, e a outra “noumênica” – a alquimia - abarcando o que estaria “por trás” dos fenômenos, o que “em essência” explicaria e determinaria o fenomênico, não transparecendo através dele.

A Alquimia afirma que todos os corpos derivam de uma matéria única e primordial, animada por uma vida única e universal, ambas, matéria e vida, manifestações polarizadas da Divindade Abstrata e Absoluta. Este saber (não um conhecer) transcendental tem como “método” a certeza de que a perseverança e a fé, aliada ao estudo detalhado dos textos dos antepassados que lograram sucesso (isto é, textos que possuem o dom divino), acabariam por lhes dar o conhecimento impregnado de uma carga mística (ou sensitiva) muito profunda.

Esse nível de saber não traz apenas a possibilidade da apreensão das causas de todas as coisas, mas de compartilhar o ser de cada coisa. Além disso, esse dom implicaria a possibilidade da regeneração do corpo físico e de sua transmutação em algo perfeito e necessariamente imortal. Quanto às propriedades da transmutação metálica, possuídas pela Pedra Filosofal, elas seriam apenas acréscimos, e não o fim em si mesmo.

Para os cientistas do modelo cartesiano/newtoniano a Alquimia seria o produto de séculos de visão de mundo com alto teor de religiosidade e mesmo de ignorância das verdadeiras leis do conhecimento humano. Para outros, em especial para uma grande parcela de cientistas atuais, sucederia exatamente o contrário: naqueles séculos de ignorância (particularmente no que chamamos de Idade Média) ela, a alquimia, teria sido a única fonte de luz que, com o passar do tempo, resultou no florescimento da atual ciência, como um ramo da árvore do conhecimento (utilizando o próprio conceito cartesiano). Sua desarticulação não surgiu de suas contradições internas, mas ocorreu no contexto do sistema objetivo do pensamento nascido com a Ciência Moderna que ela mesma havia gerado. Em síntese, a Alquimia teria se recusado a partilhar do “dogma moderno” (o dogma da razão) que desvinculou o sujeito e o objeto.

O alquimista sempre foi o perseguidor da perfeição em todos os reinos da natureza. Age através do Criador Maior, e sua função é o aperfeiçoamento de sua divina obra. Já o químico busca o entendimento dos processos a partir dos fundamentos racionais do ser humano, um registro claro e evidente que possa ser universalmente conhecido por outros seres humanos. A perfeição, mais ainda, a mania de perfeição que os bons químicos costumam estabelecer como parâmetro de trabalho em nada se assemelha a aquela procurada pelo alquimista. O químico visa à precisão; o alquimista, à compreensão do todo.

O alquimista poderia também ser visto como alguém que denominaríamos hoje de holista: como astrólogo, médico e filósofo, procurando reunir o máximo do conhecimento de sua época. Esse conhecimento, combatido sem trégua pelo fanatismo religioso da igreja romana, que considerava satânico todo o saber sem o aporte dos textos sagrados, passou a ser transmitido pelos mestres a alguns discípulos que eram iniciados em sua "Arte".

A nosso ver ficaria melhor estabelecer a alquimia como a antecessora natural da química, ou seja, a química ainda exercida como arte. Os textos alquímicos são escritos numa linguagem não-convencional que se convencionou chamar de linguagem-de-pássaros, que visava interditar o conhecimento aos mais afoitos e ineptos. E aí reside mais uma diferença fundamental: a alquimia era para iniciados e a química, enquanto ciência, um conhecimento universal.

Nesse ponto chegamos a aquele personagem que mais se destacou no estudo da Iatroquímica, a química destinada à cura, em suas mais profundas raízes alquímicas: nos referimos a Aureolus Phillippus Theophrastus Bombast von Hohenhein, o Paracelso.

Nascido a 10 de novembro de 1493, em Einsiedeln, um vilarejo nas montanhas da Suíça alemã, seu pai era médico e foi seu primeiro incentivador na busca pelos segredos da medicina. Seu avô foi o Grão Mestre da Ordem dos Cavaleiros de São João, ordem essa que recebeu todo o acervo da Ordem dos Templários, quando estes passaram a ser perseguidos pela Igreja. Os Templários eram uma ordem monástico-militar, que tinham o objetivo de defender a Terra Santa dos muçulmanos e possuíam o conhecimento do esoterismo islâmico, sendo famosos pelo uso da alquimia e por, supostamente, utilizarem poderes sobrenaturais. Provavelmente, Paracelso teria se iniciado na alquimia com o seu avô por intermédio da herança dos Templários. Posteriormente teria feito parte de uma irmandade de alquimistas, da qual teria recebido a tarefa de passar seus conhecimentos para a medicina, pois na época esta se encontrava no que eles consideravam “trevas da ignorância”.

Ainda moço foi morar na Áustria, país no qual seu pai foi trabalhar, podendo assim observar as doenças que mais assolavam os trabalhadores das minas de Fuggers (o dono destas minas era o alquimista tirolês Sigmund Fugger). Freqüentou as Universidades da Alemanha, França e Itália, estudando medicina em Viena e em Ferrara, com Trithemius (alquimista e célebre abade do convento de São Jorge, em Wurzburg), obtendo seu grau de doutor em 1515. No período 1517 a 1524, viajou como médico em vários exércitos, pela Holanda, Escandinávia, Prússia e possivelmente no Oriente próximo, adquirindo assim, grande prática no tratamento de diversas enfermidades. Logo depois, retornou para as minas de Fuggers onde estudou as condições de saúde dos mineiros.

Foi neste contexto que surgiram as revolucionárias idéias de Paracelso (durante o estudo da medicina, ele se rebela contra os conhecimentos que considerava ortodoxos, particularmente os textos galênicos, sendo célebre a queima de vários livros de Galeno levada a efeito por Paracelso em praça pública) apresentando uma visão totalmente oposta a vigente, considerando o ser humano como um todo integrado e harmônico constituído de mente e corpo. Paracelso acreditava que a anima - conceito semelhante ao princípio vital - governava o organismo. Criou uma filosofia química para interpretar o mundo, considerando a Criação como um grande processo químico divino e acreditando que as doenças eram fruto de reações químicas produzidas pelo organismo.

Suas idéias revolucionárias eram o fruto de uma importante formação alquímica (Paracelso é considerado um dos mais controversos alquimistas de todos os tempos). A alquimia, para ele, não tinha o intuito de transformar metais em ouro, mas sim servir como instrumento auxiliar no restabelecimento da saúde, sendo utilizada como base para o preparo dos medicamentos minerais, através de técnicas alquímicas de separação e purificação.

Paracelso combateu os princípios da medicina tradicional - considerados por ele obscuros e sem fundamento - propondo uma terapêutica química. Percebeu a possibilidade de utilização dos conhecimentos da alquimia na medicina, na formulação e descobrimento de novos medicamentos, sendo, portanto, o precursor da Iatroquímica - que mais tarde deu origem à Química - além de, de certa forma, antecipar vários fundamentos da farmacologia, da medicina psicossomática, da psicologia e bioenergética.

Ensinou suas idéias na universidade de Basiléia por volta de 1527, onde foi duramente criticado, fazendo tantos inimigos, que precisou fugir da cidade. Assim iniciou-se uma longa e triste luta em prol do que ele acreditava ser o bom senso na medicina, que tinha reflexos ostensivos sobre sua fama e condição financeira - alternada entre períodos mais tranqüilos e períodos de miséria. Rebelou-se também contra o sistema de ensino das ciências. Nesta época, a língua científica escrita e falada era o latim e Paracelso acreditava que isto prejudicava a difusão do saber, pois somente poucos eruditos tinham acesso às universidades e podendo, assim, usufruir do conhecimento. Neste contexto, tentou introduzir uma língua mais acessível ao povo - o alemão - em seus escritos e aulas, fato que foi seguido, posteriormente, por vários outros professores.

Paracelso foi, por tudo isto, denominado o "médico maldito" e sua doutrina constantemente veiculada ao ocultismo - por conta de crer em "influências astrais". A maior parte de suas obras foi publicada após sua morte, sendo que entre 1589-1591, apareceram as primeiras edições de seus trabalhos, quase completos, que versam sobre clínica médica, diagnóstico, farmacologia, filosofia, teologia, alquimia, influência dos astros, magia, formulação e prescrição dos medicamentos. Suas obras consideradas como mais importantes são: o Tratado Sobre as Feridas Abertas (1528), Paramirum (1530-1531). Chirurgia Magna (1536), De Gradibus (1568), Tratado Sobre as Enfermidades dos Mineiros (1576), Opúsculo sobre os Banhos Minerais (1576) e De generatione stultorum (tratado no qual correlaciona o cretinismo com o bócio endêmico). Escreveu também um livro de profecias Os Prognósticos, que não conseguiu igualar “As Centúrias” escrito por Nostradamus - este, como Paracelso, também era médico, astrólogo e alquimista.

No ano de 1538 abandonou a vida pública, possivelmente por problemas de saúde. Relatos indicam que tenha sido por conta de uma doença que permanece desconhecida até a atualidade. Retirou-se para Mindelheim, cuidando de sua saúde e colocando em ordem suas obras. Em 1540 foi para Salzburgo, com intuito de desfrutar um melhor clima. Deste período até sua morte, dedicou-se profundamente à espiritualidade, quando escreveu seus trabalhos mais místicos, dentre eles, alguns comentários sobre a Bíblia Sagrada.

A descrição de sua morte constitui um assunto controverso, para o qual existem várias hipóteses. Morreu aos 48 anos, em 1541, sendo enterrado, segundo alguns, na Igreja de São Estevão. Para outros estudiosos de sua vida Paracelso teria morrido em Salzburgo e sido enterrado junto com os pobres do Asilo de Velhos no cemitério de São Sebastião. Muitos relatos sugerem que Paracelso poderia ter simulado a própria morte, para fugir da perseguição incessante comandada por vários médicos ortodoxos. Há também indícios de que Nostradamus teria se encontrado com Paracelso na Alemanha, alguns anos após a data da sua suposta morte.

Com relação às suas teorias podemos afirmar que era partidário da doutrina dos quatro elementos (Terra, Água, Fogo e Ar), por herança de Empédocles, Hipócrates e mesmo Galeno. Acreditava, porém, que esses quatro elementos apareciam nos corpos sob a forma de três princípios: sal, enxofre e mercúrio. O sal como princípio da fixidez e incombustibilidade; o enxofre, da combustibilidade e o mercúrio, da flexibilidade e volatilidade. Comparou esta "Tria Prima" a outro sistema ternário sobejamente conhecido: corpo, alma e espírito.

Paracelso preconizou uma nova terapêutica das doenças baseada no princípio de que o ser humano era formado por elementos básicos cujo desequilíbrio provoca todas as doenças. Suas idéias sobre as doenças baseiam-se num conceito que poderíamos chamar de "cósmico" do mundo e da humanidade, indo muito além da visão tradicional da sua época, que se baseava na doutrina dos fluidos de Galeno e Hipócrates. Segundo esse ponto de vista (já bem deteriorado e distante da complexidade do saber hipocrático) a doença era causada pelo mau funcionamento e mistura dos quatro fluidos do corpo: sangue, bile negra, bile amarela e fleugma. Paracelso contrapôs o seu conceito de saúde como equilíbrio e doença como o desequilíbrio de todas as energias presentes no ser humano.

Assim a arte de curar, de acordo com Paracelso, apoiar-se-ia em quatro pilares: a filosofia, que significaria "abrir-se ao conjunto das forças naturais, observar essas forças invisíveis na penetração da realidade total e perceber o invisível no visível"; a astronomia, que nos ensina como as estrelas nos influenciam; a alquimia, útil principalmente na preparação dos remédios; e a virtude, a honestidade do médico. De acordo com Paracelso, o médico é a imagem primordial de uma pessoa que está se aperfeiçoando. Mais do que qualquer um, o médico deve reconhecer a ação da natureza invisível no doente ou, em se tratando do remédio, como ele deve trabalhar no visível.

Para podermos nos aproximar das idéias de Paracelso, é inevitável considerar determinadas imagens básicas, que normalmente são rejeitadas pela medicina convencional, porque se apóiam, acima de tudo, em opiniões "ocultas". As duas palavras chave desse lado "secreto" de Paracelso são imaginação e magia. No livro “Paracelso, Alquimista, Químico, Pioneiro da Medicina”, o historiador e filósofo Lucien Braun dedica um extenso capítulo a esse aspecto para explicar o significado básico de tais idéias. De acordo com  Braun é muito difícil explicar a "imaginação" como "sem sujeito e sem imagens". Porque Paracelso quer apenas possibilitar que a natureza apareça, "que a própria luz da natureza surja, mostrando-a. Mas ela apenas mostra a luz àquele que sabe ver sem imagens".

A natureza é mais do que nossos olhos enxergam, segundo Paracelso, ela é "o invisível que pulsa através do visível". O invisível nunca se apresenta como imagem, porque ele não é um objeto, é energia viva, criativa; uma energia não-dividida, que tira as coisas de seu interior, transformando-as no que são na realidade.

Braun acredita que foi Paracelso quem pela primeira vez expressou essa diferenciação histórica do pensamento ocidental. Foi ela que inspirou Paracelso em relação a seus mais famosos dizeres: "O visível esconde o invisível, mas apesar disso conseguimos ver o invisível apenas através do visível." Para ele a natureza não é apenas aquilo que nossos olhos enxergam, nem somente o que existe num outro lugar, mas ambos ao mesmo tempo.

Escreveu Braun: "Assim, não é de surpreender que foi Paracelso quem introduziu a descrição da força de imaginação, dando desse modo um nome à energia imanente, que fixa as coisas do interior para fora, cria, faz surgir e não pode ser imaginada de modo algum. Outros atributos dessa força: ela flui através de todas as coisas, 'através de todo esse imenso mundo', e é tão eterna como tudo que existe e não existe, tudo que 'está sendo'”.

Segundo Paracelso, imaginação e magia estão intimamente ligadas. E nesse caso magia quer dizer ação direta sobre coisas, pessoas e todos os seres, sem ajuda da matéria. Ou, expresso de outro modo: o mago é capaz de causar efeitos físicos sem ajuda física (pois ele está além da física). "Afinal", salienta Braun sobre os pensamentos de Paracelso, "toda natureza invisível se movimenta através da imaginação. Se a imaginação fosse forte o suficiente, nada seria impossível, porque ela é a origem de toda magia, de toda ação através da qual o invisível (de um ou outro modo) deixa seu rastro no visível. A energia da verdadeira imaginação pode transformar nossos corpos, e nossas idéias..."

Baseando-se nesse fundo filosófico, Paracelso ligou as características exteriores de um remédio com aquelas ditas “interiores” de uma doença. Um remédio "se mostra pela sua assinatura" (o seu lado invisível)  porque o exterior do material de que ele é extraído espelha sua função e atributos.

Assim, por exemplo, folhas em forma de coração foram recomendadas para doenças cardíacas. Mas também a época em que o remédio é tomado deve estar certa, pois a energia de uma planta só pode ser liberada durante determinadas constelações planetárias. Remédio, médico e doente formam um todo em harmonia, de acordo com as leis da natureza. O conhecimento médico tem menos a ver com conhecimento intelectual do que com a intuição e o olhar atento do observador.

O que podemos aprender de Paracelso é principalmente a necessidade de pensar sobre a medicina e o que ocorre durante o tratamento desse ponto de vista absolutamente transcendental. Para cada doença deve existir um remédio específico, assim como cada indivíduo é uma totalidade distinta de outro. Paracelso era  alguém que via a matéria penetrada pelo espiritual. Contra um conhecimento que caminhava para um especialismo acentuado (o que ele chamava de especialismo era o desmembramento das diversas ciências nascentes) ele enfatizou um pensamento total.

Ele reconheceu o microcosmo perante o macrocosmo; admitiu a existência da Archeus, força inata, vital e oculta, que ele situou no estômago. A vida do homem deve ser vista como inseparável da do universo. O limus terrae, da qual se origina o corpo, não é original, mas representado por extratos de substâncias já presentes em seres previamente criados. É nele que  encontramos o sal, o enxofre, o mercúrio. E é a separação desses elementos que acarretaria as doenças, ocorrendo por falha da Archeus.

Na sua própria iatroquímica ele utilizou certa metodologia mística, indicando drogas com forma e coloração comparáveis às dos órgãos aos quais se destinavam. Assim, por exemplo, o ouro, já relacionado pela alquimia, ao coração e a pulmonaria aos processos respiratórios. Em ocorrência comparável, a pele do lagarto foi indicada no tratamento de tumores malignos. Podemos relacionar essa terapêutica com o símile; um símile mágico, um símile transcendental, um símile das assinaturas.

O microcosmo e o macrocosmo encontram-se em relações constantes e recíprocas, por isso, Paracelso denominou o macrocosmo como "o homem exterior". Para ele o sal, o enxofre e o mercúrio além de serem componentes de metais, são também de toda a matéria viva. E eles devem ser avaliados simbolicamente: sal, o componente sólido, indestrutível pelo fogo; mercúrio, o fluido, vaporizado mas não modificado pelo fogo; enxofre, alterado e destruído pelo fogo.

Nesse momento acreditamos que devemos tocar um ponto fundamental, que inclusive esclarece o porque de termos nos enveredado pelo pensamento de Paracelso. E nada melhor do que deixar que Paracelso nos “diga” alguma coisa.

Sobre o Princípio dos Contrários:
“Contraria contrariis curantur, quer dizer, calor dispersa frio; isso é falso e jamais foi aplicável às drogas...o frio não subjuga o calor, nem o calor, o frio. O que causa icterícia também cura icterícia. Isto é, bom e mau estão numa mesma coisa; a icterícia provém do mau, mas separando-se o bom, obtém-se o arcano (medicamento) contra icterícia ... porque as drogas que curam a paralisia devem provir daquilo que a causa ... assim compreendem-se os arcanos dos minerais”  (Paracelso – “Paragranum”)

Sobre os medicamentos:
“Porque as drogas devem ser administradas não pelo peso, mas por algo que está para além dele. Pois quem pode pesar os raios do sol, quem pode pesar o ar? Então, de que modo as drogas devem ser administradas? A droga deve atuar no corpo como um fogo” (Paracelso – “Paragranum”)

“A natureza dos arcanos é tal que eles vão diretamente de encontro às propriedades do inimigo, como um combatente vai de encontro a outro.  A intenção da natureza é a de que, no combate, um estratagema seja empregado contra outro estratagema,  e essa é a tendência natural de todas as coisas sobre a terra; na medicina, também, idêntica regra prevalece. O médico deve deixar que isso lhe sirva de exemplo. Da mesma forma que dois adversários entram em luta, ambos frios ou ambos quentes, atacando-se com a mesma arma, assim também é a vitória que se busca no corpo humano; os dois combatentes buscam auxílio na mesma fonte, ou seja, no mesmo poder.”  (Paracelso – “Archidoxis”)

“Porque é uma esperança e uma crença inúteis recomendar tantas substâncias numa prescrição, pois as pobres pessoas acreditam que, como elas são tantas, se uma não puder ajudar, uma outra talvez possa. Oh, pobres prescrições! Isto nada mais é do que sair da lama e cair no atoleiro” (Paracelso – “Podagra”)

Sobre a individualização e a totalidade do paciente:
“Mas agora, pelo efeito da droga, saiba que a natureza do homem é uma e outra (isto é, diversificada). Daí, numa pessoa há muito suor, noutra não; que não é de natureza diaforética. Também existe um tipo que vomita muito e outro, não; porque não é do tipo vômico. Por isso é um equívoco quando alguém afirma ter curado um paciente pelo suor ou pelo vômito. Não se considera a natureza variada do homem” (Paracelso – “Podagra”)

“Porque a saúde provém do homem como um todo, não de fragmentos dele; isto nunca é considerado pelos colegas, tendo sido sempre uma colcha de retalhos; o quente para o frio, o constritivo para o laxativo, isto não é base para o médico, nem nunca foi.” (Paracelso – “Paragranum”)

Nem é necessário salientar a enorme semelhança dos conceitos expressos acima com aqueles preconizados pela homeopatia. Porém, parafraseando R. E. Dudgeon em seu texto “O Princípio Homeopático na Medicina antes de Hahnemann” (que foi um dos que nos serviu de base para o presente trabalho), dificilmente consigo imaginar que Hahnemann, como um grande estudioso que foi, não tenha lido os trabalhos de Paracelso. Entretanto, não encontramos uma linha sequer em seus trabalhos citando Paracelso. Isso nos intrigou durante um longo tempo até que pudéssemos entender (assim acreditamos) o porque desse “silêncio”.

Para melhor compreender a “solução” que encontramos para desvendar esse mistério, nada melhor do que penetrarmos um pouco mais detalhadamente no universo do pensamento de Samuel Hahnemann, em especial nos primeiros parágrafos do Organon, que definem o esteio filosófico da sua teoria médica, a Homeopatia. E é isso o que faremos em nosso próximo artigo.

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